Kurt Cobain: Montage of Heck

9ad9c9176869fbc3610b098df2e8d168Como se faz um documentário sobre Kurt Cobain? Como se representa um homem que alcançou o patamar onde se encontram os maiores ícones da música sem endeusá-lo ou demonizá-lo?
Brett Morgen, realizador de Kurt Cobain: Montage of Heck, fá-lo através do acesso aos pertences do músico norte-americano, aos seus desenhos, às suas cassetes, gravações, diários… No fundo, Courtney Love e a sua filha, Frances Bean – que é também ela produtora do documentário -, abriram-lhe as portas para os cantos mais obscuros da mente de Cobain. Se adicionarmos o facto do realizador ter querido entrevistar somente as pessoas que estariam no funeral de Kurt Cobain caso ele tivesse permanecido um “mero” empregado de limpezas, temos assim acesso também à visão dos seus pais, madrasta, irmã, ex-namorada, Courtney Love e também do baixista dos Nirvana, Krist Novoselic. É clara a falta do baterista Dave Grohl que foi entrevistado, mas demasiado tarde para ter sido incluído no documentário.

Montage of Heck é, na verdade, o nome de uma cassete que Morgen encontrou nos pertences de Cobain. Esta cassete continha excertos de Beatles, Black Flag, audio de filmes de ficção científica e de horror; uma experiência auditiva que abriu a Morgen uma fresta do caminho que iria seguir. Após absorver tudo o que se encontrava nos pertences de Cobain, Morgen tinha assim uma linha condutora para o documentário, linha esta que conseguiu transpor para o “papel” em apenas três horas.

Entramos, assim, numa viagem de 145 minutos pela mente de Cobain através da sua escrita, dos seus diários e dos seus desenhos que ganham vida através de animação. É, aliás, uma narrativa que nos leva para uma outra dimensão a partir do momento em que nos são mostrados momentos íntimos da vida de Cobain através de vídeos caseiros, bem como de momentos da sua adolescência que são representados através da animação de Hisko Hulsing.

Este é o único documentário oficial acerca de Cobain e é também ele um retrato extremamente intenso da sua vida, das suas constantes insatisfações com a sociedade e com as repressões e hipocrisias da mesma, da sua postura reaccionária e anti-social, do seu sentimento de não-pertença em lado algum, contraposto unicamente pelo seu desejo de construção e de pertença de e na sua própria família, do consumo de drogas e da ascensão dos Nirvana, com tudo de bom e de mau que isso lhe trouxe.

They laugh at me because because I’m different, I laugh at them because they’re all the same.

Se o espectador sair do filme perturbado, então o realizador cumpriu a sua missão. Conseguiu transpor para o ecrã os meandros da mente complexa, perturbada, desorganizada e brilhante de Cobain e a esta mente, goste-se ou não do género musical, ninguém consegue ficar indiferente.

I’d rather be hated for who I am than loved for who I am not.

Há ainda que acrescentar que a narrativa que Morgen escolhe para o documentário é uma narrativa que se baseia apenas na vida de Cobain: nas suas músicas, palavras, vídeos e arte. O que significa que a temática do seu suicídio não é abordada. E bem, na modesta opinião da autora deste post. Trata-se de um documentário que nos mostra de uma forma nua e bastante crua o impacto de Cobain e da sua música, bem como do caminho de um homem até se tornar uma lenda no mundo da música e uma voz de uma (terá sido só uma?) geração.

Documentário: Kurt Cobain: Montage of Heck
Realizador: Brett Morgen
Ano: 2015

6 thoughts on “Kurt Cobain: Montage of Heck

  1. Ainda não vi o documentário mas de tudo o que tenho lido nesta última semana e do teu post fico com a ideia de que se vai finalmente saber um pouco mais sobre a pessoa atrás do mito. Nunca fui a maior fã dos Nirvana, talvez fosse demasiado nova na altura em que eles surgiram, mas é impressionante perceber como ainda hoje, passadas duas décadas da sua morte, continua a ser um ícone até para os miúdos desta nova geração (haja esperança!). Tenho de ir ver o doc 😉

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  2. Estou em pulgas para ver esse documentário.
    Os Nirvana marcaram musicalmente a minha geração como um ferro em brasa. Amava-se ou odiava-se mas ninguém lhes era indiferente. Nesse tempo áureo do grunge havia uma apaixonada “rivalidade” musical Nirvana /Pearl Jam. Não se podia ser fã das 2 bandas, ou se ouvia uma ou outra. Eu confesso que musicalmente de início até pendi para os Pearl Jam mas quando “conheci” o Cobain rendi-me completamente aos Nirvana. É que tudo o que no Kurt Cobain era genuíno, verdadeiro, cru, dorido era no Eddie Vedder falso, postiço, fabricado e pretensioso. Ao pé do Cobain o Vedder (da altura) era de tal maneira um “poseur” que eu fiquei anos sem conseguir ouvir PJ 😀
    Pergunto-me o que é que o Cobain diria de ser considerado hoje em dia uma lenda musical. Ele que nunca procurou a fama, que nunca se sentiu bem com as luzes da ribalta, que ficava desconfortável com rótulos e pressões sociais.
    Provavelmente encolheria os ombros e seguiria caminho indiferente a todas as percepções que os outros criaram dele 🙂

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    • Eu apanhei o gosto por este movimento por influência do meu irmão, pois ainda era muito novinha quando apareceu, e é engraçado que sempre foi mais direccionado para os Pearl Jam. Por isso deixa-me discordar aí numa parte! 😉 Acho que tudo o que o Eddie Vedder transmite é tudo menos falso ou fabricado. Era genuíno. A diferença é que com Kurt Cobain era muito mais intenso e perturbante/ado.
      Hás-de ver o documentário sobre os Pearl Jam, o PJ Twenty. Também ele é muito interessante, apesar de se focar mais na banda e no movimento grunge, enquanto que este se debruça mais sobre a pessoa de Kurt Cobain.
      Sim, acho que a ideia de ser uma lenda lhe iria fazer muita confusão e ele iria recusar esse estatuto. Mas acho que é um estatuto que não se escolhe, por muito que muitas pessoas trabalhem ou se esforcem para isso. Ou se é ou não se é. Há pessoas que são especiais e Cobain era definitivamente uma delas.

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  3. Ei espera lá! Eu referi-me ao Eddie Vedder da altura- o do início dos anos 90! Esse Vedder era (ou pelo menos parecia a ser porque as percepções valem o que valem) um produto fabricado pelas editoras, uma estrela rock talhada à medida para contrapor ao Kurt Cobain. Hoje em dia já não sou nada dessa opinião mas naquela altura, era essa a imagem que ele (me) passava.
    O Vedder de hoje é diferente. É um tipo que se transformou, amadureceu e cresceu como músico e como ser humano e acho que é uma das pessoas do mundo da música que melhor lida com a fama. Até tenho a convicção que se o Cobain fosse vivo eles seriam amigos e não rivais 🙂

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  4. Nunca percebi essa rivalidade Kurt vs Vedder quando na altura (e hoje) o Mike Patton era muito mais interessante 😀 (isto sou só eu a lançar mais lenha nessa discussão :P)

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