À sexta estou… a celebrar o Halloween revisitando o clássico dos clássicos de terror: Drácula de Bram Stoker (o livro e o filme)

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Clássico absoluto da literatura “Drácula” é um romance escrito em 1897 pelo autor irlandês Bram Stoker. Esta história de suspense e terror, tem como protagonista um dos personagens mais terríveis que nasceram na literatura: o famoso conde Drácula, uma criatura trágica e nocturna que se alimenta do sangue dos vivos.
A história tem início quando o solicitador Jonathan Harker chega a um castelo numa zona remota da Transilvânia e trava conhecimento com o proprietário do castelo, o excêntrico conde Drácula. Aos poucos Harker percebe que mais do que excêntrico, há algo de realmente assustador e tenebroso no seu anfitrião e… terão de ler o livro para saber o resto.

Muitas vezes copiado, citado, visitado e revisitado “Drácula” é o mais famoso, popular e amado de todos os livros de vampiros da história da literatura.
À época da sua publicação alguns leitores descreveram o livro como sendo “o romance de gelar o sangue do século”!
Isso era tão verdade há 118 anos atrás como ainda é hoje.

NOTA: O livro está em domínio público e pode ser obtido gratuitamente on line em Inglês.

Se preferirem ver um filme, podem escolher antes a sua adaptação cinematográfica realizada em 1992 por Francis Ford Coppola, um filme que é uma verdadeira festa para os olhos.

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Apesar de ser criticado por alguns puristas por contar uma história de amor que não está no livro (Coppola colocou como foco central do filme a história de amor entre Drácula e a personagem Mina Harker) a autora deste post gostou muito desse twist inesperado e aplaude essa concessão aos tempos modernos.

Compreendamos que a natureza “monstruosa” do Drácula original era por si só suficientemente interessante para o público do séc. XIX porque reflectia o lado sombrio da era extremamente moralista em que foi originalmente escrito.
Mas nós os leitores e cinéfilos do século XX e XXI, ao contrário dos da época Vitoriana, somos menos moralistas, mais tolerantes e complexos, gostamos de perceber o que realmente se esconde por trás do coração de um monstro e porque é que ele é da maneira como é ( ou se calhar somos é uns grandes choninhas que nos derretemos todos quando Drácula diz a Mina que atravessou oceanos de tempo para estar com ela).

Reza a história que Coppola terá sido atraído pelos elementos sensuais do argumento e quis que muitas partes da história do filme se assemelhassem a um sonho erótico. Ao conceber o filme pediu aos Figurinistas que lhe dessem designs “estranhos” saídos dos seus próprios pesadelos!
Também insistiu que não queria usar nenhuma espécie de efeitos especiais contemporâneos e nem imagens geradas por computador, preferindo usar efeitos técnicos antiquados(como os que eram usados nos primórdios do cinema) e tudo isto contribuiu para tornar Drácula num portentoso objecto de culto.

“Drácula de Bram Stoker” tem também um elenco excepcional com Gary Oldman no papel do conde Drácula, Winona Ryder(como Mina Harker), Sir Anthony Hopkins(como o caçador de vampiros Van Helsing) e Keanu Reeves(como Jonathan Harker) e curiosamente o cantor Tom Waits como Renfield.

Apesar do “overacting” de Anthony Hopkins, do “no acting” de Keanu Reeves (duramente criticado na altura) e do “overreacting” de Gary Oldman (que o resto do elenco dizia que era um colega insuportável, porque -como bom actor do Método – durante todo o tempo em que duraram as filmagens NUNCA, saía da personagem de Drácula) ou se calhar por causa disso tudo, o filme resulta numa delícia de excessos visuais, uma obra-prima gótica concebida com o amor, a loucura e o cuidado estético e conceptual de um génio cinematográfico e que nos bate com a mesma força de 1 copo de absinto (essa bebida amada dos artistas franceses do séc. XIX também conhecida popularmente por fada verde em virtude de provocar um suposto efeito alucinógeno) bebida que, aliás o próprio Drácula oferece a Mina no filme.

Tanto o livro como o filme estão actualíssimos e suponho que enquanto houver desejos corruptos, selvagens e moralmente ambíguos que continuem a atormentar a condição humana estarão sempre!

Feliz Halloween! Bons sustos!

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“Vem passear na minha Lua”

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Gregório Duviver é um actor, humorista e poeta que está neste momento muito em voga graças ao fenómeno brasileiro Porta dos Fundos.  Por se tratar de um canal de vídeos humorísticos que lhe dá mais visibilidade, pelo menos em terras lusas, é natural que exista uma associação directa entre o actor e este género de entretenimento/representação da realidade.

Esta indissociabilidade entre um actor e o seu trabalho acarreta o risco de poder estancar os limites do seu horizonte. Como consequência, pode também fazer com que o público que se dirija para assistir a uma peça sua o faça na expectativa de encontrar uma peça que enverede na mesma linha humorística do canal Porta dos Fundos. Mas isto apenas enganará o público menos atento, pois quem teve a oportunidade de ouvir algumas das entrevistas que Duvivier deu à rádio portuguesa ficou logo alertado que se trataria de uma peça indefinida em termos de género. Sim, é uma comédia. Sim, também é um drama. Se é mais um género ou outro, isso dependerá apenas do estado de espírito do espectador, dos óculos com que observará a peça e da forma como assimilará o conteúdo da mensagem da personagem.

Viajemos então para a sala do Tivoli, em Lisboa.

Apagam-se as luzes. Acendem-se focos de luz direccionados para o local do palco onde se encontra o actor. Mas por breves segundos, pois o foco de luz que apontava para a esquerda, estava no momento seguinte a apontar para a direita, para a frente, para trás, acendendo e apagando por diversas vezes, dando logo o indício de que estaríamos perante os dois principais elementos da peça que se relacionariam no decorrer da próxima hora numa simbiose perfeita: o actor e a iluminação cénica. O palco, despido de cenários, tem apenas um fundo preto que se confunde com os trajes escuros do actor. É o vazio de toda a envolvente, quando conjugado com o jogo da iluminação, que trabalha para que o espectador se foque na personagem e no seu pensamento, ainda que por vezes esquizofrénico.

E assim nos é apresentada a personagem de Uma Noite na Lua: Um homem em cima do palco pensando. Um homem. Em cima do palco. Pensando. Um homem. Pensando. Em cima do palco. … … …

E este pensamento é repetido por diversas vezes. Pois a personagem que nos é apresentada a pensar sobre um homem em cima do palco a pensar não é mais do que o autor de uma peça que ainda estaria por ser criada. Esta personagem havia-se comprometido a criar uma peça da noite para o dia, literalmente, num contexto social que nada tinha a ver com o seu contexto habitual. E o espectador vai percebendo isso quando a personagem começa a desabafar que pretende tornar-se num novo homem, um outro homem, fazendo coisas que não seriam habituais suas, cumprindo objectivos que nunca havia cumprido, suprindo comportamentos naturalmente seus. Tudo por causa de Berenice, a mulher que o deixou amargurado na sua Lua. Nada do que a personagem diz querer fazer de diferente, nem sequer nada da peça que ele quer criar é para Berenice. Logo, tudo é para ela. Tudo é por ela.

Assistimos a uma perda afectiva e aos efeitos que isso provoca num homem. Assistimos a uma consequente crise criativa. E assistimos, acima de tudo, a uma angústia presente até nos momentos mais cómicos da peça. Pois quem consegue observar o personagem, vê que o humor é, no fundo, uma catarse da angústia espiritual e emocional que atravessa.

Uma Noite na Lua é uma peça que irá apanhar desprevenido os mais incautos, emocionará os mais atentos, mas recompensará todo e qualquer espectador com uma actuação brilhante de Duvivier que, sozinho em palco, brilha mais forte que um vasto elenco.

“Vem passear na minha Lua”, diz a personagem, e eu aceito o convite de bom grado.

Peça: Uma Noite na Lua
Texto e Direcção: João Falcão
Actor: Gregório Duvivier

Hamletbatch(*)- A infância, e a natureza de todas as coisas que entre o céu e a terra são sonhadas na nossa vã filosofia.

(*) Hamletbatch- termo carinhoso utilizado pelos fãs de Benedict Cumberbatch para se referirem ao papel do actor na célebre peça de William Shakespeare, Hamlet.

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Aguardada com grande expectativa, a peça Hamlet encenada por Lyndsey Turner, produzida por Sonia Friedman e protagonizada por Benedict Cumberbatch era o acontecimento teatral do ano. Os bilhetes para os 4 meses das suas representações voaram no mesmo dia em que foram postos à venda e a peça estava esgotadíssima desde Agosto de 2014. Perante todas estas evidências a autora deste post já se tinha resignado a aceitar a cruel realidade de que nunca a conseguiria ver. Como fã de teatro em geral, e em particular do Bardo, da peça Hamlet e “last but not least” de Benedict Cumberbatch, esta era uma decepção que era sentida com força em quatro frentes.

Foi assim com grande alegria, que recebi a notícia de que o UCI tinha estabelecido uma parceria com o British Council, para promover as peças da RSC(Royal Shakespeare Company) e iria através do “National Theatre Live”  transmitir também a peça “Hamlet” em directo, do teatro Barbican em Londres para Lisboa. Esta iniciativa já habitual noutros países era (tanto quanto sei) totalmente inédita até à data em Portugal.

À hora e na data marcada nota-se com agrado que a sala do UCI está repleta de gente. Vislumbram-se na audiência o que devem ser alguns alunos e professores do British Council e alguns actores e autores conhecidos da nossa praça. Uma audiência que só pode ser conhecedora. A peça é em Inglês (aliás, no difícil Inglês de Shakespeare), não tem legendas nenhumas e tem 3h20m de duração (incluindo 20 minutos de intervalo). Quem está ali sabe ao que vai, e vai por interesse, por ofício mas sobretudo vai por gosto.

Hamlet tem então ínicio com Benedict Cumberbatch a ouvir a música “Nature boy” na versão de Nat King Cole. Está dado o mote para o tom da peça e compreendida a razão de ser do cartaz de promoção (que retrata os actores como crianças e que tanta discussão causou).

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Nessa primeira cena percebemos que Hamlet é um rapaz que tenta conformar-se com o que esperam dele (que cresça, que seja um homem e que ultrapasse o luto da morte do seu pai), sacrificando a ligação à sua natureza mais autêntica (os seus sentimentos).
A encenadora Lyndsey Turner afasta-se conscientemente de anteriores interpretações de Hamlet que dão ênfase acima de tudo à teoria do complexo de Édipo e às suas alegadas e inconscientes pulsões sexuais incestuosas. Não há pulsões dessa natureza neste Hamlet. As suas subversões, ainda que remetam para a infância são de natureza muito mais subtil.

A morte do pai causou uma ferida emocional na psique de Hamlet que abalou a sua vida e ele procurará no retorno à infância o conforto que não encontra em mais lado nenhum.
A batalha da psique de Hamlet que Cumberbatch tão bem soube transmitir é que apesar do homem em si conhecer o segredo que ninguém mais conhece, o seu tio Claudius (um portentoso Ciarán Hinds) matou o seu pai para ficar com o seu reino e com a sua mãe, a criança que há em Hamlet que não quer crescer, não quer ouvir, tem receio de agir, e esconde-se na sua mente para não ter de lidar com isso.

A necessidade de regressar à infância que só era pressentida, apresenta-se agora à sua consciência como um destino inevitável. Assim é o Hamlet de Cumberbatch a tocar os seus discos de música nostálgica, com o seu castelo de brincar, o seu uniforme de soldadinho, o seu casaco com o título “KING” escarnecendo dos
adultos, do reino da Dinamarca, das responsabilidades que lhe querem atribuir. Sarcástico com os empregados, irónico como pai de Ofélia, Polónio (Jim Norton) e com os seus amigos, hostil com o seu tio e cruel nas suas tiradas ao seu amor Ofélia, e à sua mãe que é a fonte principal de todos os seus desgostos e de todas as suas neuroses.
Inconstante como uma criança petulante nos seus afectos, no seu temperamento, na sua loucura. É essa a imagem que ele projecta aos outros.

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Mas quando só o público o consegue ver é que Hamletbatch mostra o que há de mais autêntico e mais profundo em si mesmo. Só nos solilóquios/monólogos vemos o homem em si a emergir e a verdadeira profundidade das paixões que o movem a manifestar-se: a ferver de indignação e a rebentar de raiva, a conspirar e a sofrer.

No meio desta batalha interior na sua psique, Hamletbatch faz muitas vítimas. O seu amor, Ofélia (Siân Brooke) é a maior delas todas. Contra ela vira ele a raiva impotente que sente pela mãe. De início choca-me a estridência desta Ofélia-criança que vê o mundo com olhos infantis através da sua máquina fotográfica a tentar capturar os momentos efémero da vida para não os perder.

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Mas vejo-a vulnerável e inocente como uma criança a lidar com a dor. Como uma criança, ela é tranquilizada, confortada, como uma criança em muitas cenas as outras personagens falam dela, falam para ela, mas nunca com ela. De todas as mortes da peça é a sua a que me mais me toca, a da criança-Ofélia a desfazer-se perante os nossos olhos.

Além do pedido de vingança há um pedido fervoroso do fantasma a Hamlet “Fala com a tua mãe”. E ele fá-lo na cena mais bonita e tocante de toda a peça.
Ajoelhados frente a frente, Hamlet e Gertrude, mãe e filho (Cumberbatch e uma fabulosa Anastasia Hille) finalmente olhando-se, finalmente falando um com o outro numa cena tão pura e tão intensa que sentimos a energia a atravessar o palco do teatro Barbican em Londres e a tocar-nos através do ecrã de cinema em Lisboa.

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O homem que é Hamlet revela o que a criança em si sentiu: toda a dimensão da traição e da rejeição da mãe quando ela pôs alguém à frente dele e da memória do seu pai, e a mãe que o ama incondicionalmente fica desfeita porque percebe que inadvertidamente o magoou e que nem todo o seu amor de mãe é capaz de o proteger da dor, do sofrimento, dos desapontamentos que resultam do facto de se crescer, de amar e perder alguém.

Hamlet percebe finalmente que não há reconciliação possível entre a criança e o homem que vivem dentro de si. É essa batalha perdida que é a grande dimensão da tragédia do príncipe da Dinamarca.
É o momento mais perfeito, bonito e intenso de toda a peça.

A partir daí, o destino de Hamlet está traçado e ele caminha inevitavelmente para a sua morte. Os cenários belíssimos reflectem destruição interior de Hamlet, que por sua vez simbolizam a destruição do reino da Dinamarca.  O assassinato de Polónio, o exílio forçado, o regresso, a descoberta do suicídio de Ofélia e a contemplação do crânio do bobo Yorick, Cumberbatch subversivo com a sua t-shirt de David Bowie, e o seu casaco de capuz é inexcedível, inesquecível e glorioso em todas as cenas e dá tudo, tudo em palco com aquela generosidade que só os grandes actores são capazes.

No final da peça, após os agradecimentos há algumas palavras suas para a causa dos refugiados sírios. Na sua voz belíssima é citado um pequeno extracto do poema “Home” da poetisa Warsan Shire, que fala da decisão difícil que os pais têm que tomar quando fogem do seu próprio país levando os seus filhos consigo para o que pode ser uma morte certa:

“No one leaves home unless
    home is the mouth of a shark”

“Ninguém abandona a sua casa
A não ser que essa casa seja a boca de um tubarão ”

Nesse momento tocante há um confetti na cara de Cumberbatch que lhe ficou da cena da morte de Hamlet. Longe de ser ridículo o confetti não tira nenhuma solenidade àquele momento bonito. Pelo contrário, eu que não acredito em coincidências não consigo deixar de ver um significado oculto naquilo.
A criança em Cumberbatch que eu tenho visto desaparecer sob o peso da pressão do estrelato, das equipas de relações públicas, do marketing pessoal, dos contractos publicitários, da estratégia dos agentes americanos, das campanhas falsas para os óscares tudo, tudo desapareceu naquela noite.
E tudo o que havia de pueril, infantil, inocente e autêntico em Cumberbatch regressou.
É a respirar o pó dos palcos que a criança que existe no íntimo de Cumberbatch, essa parte de si próprio que é feliz, espontânea, confiante e emocionalmente expressiva se revela. É ali que ela se sente amada, acarinhada e realizada.

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Eu vi-a e vi-te a ti Cumberbatch. Não a estrela mas o actor. Vi como foste perfeito a exprimir e a dar forma ao terror, à beleza e ao poder das emoções sombrias de Hamlet, como mergulhaste profundamente no reino dos seus sentimentos e acedeste ao que lá estava: a alma e a tristeza, e todos esses lugares insondáveis e tão escuros que não podem ser vistos com clareza só vagamente pressentidos. E tu, conseguiste mostrá-los!
Foste grande. Foste inteiro. Foste tu.
Por isso tudo muito obrigada, Benedict.

Não deixes que matem a criança que há em ti!

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Dave Matthews Band: o concerto da banda que arruinou a minha vida

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Desde o primeiro minuto em que o álbum ” Under the table and dreaming” rodou no meu leitor de cds que a minha vida foi arruinada pela Dave Matthews Band.
Começou ali um amor quase obsessivo, e ao qual eles não correspondiam de corpo presente mas que alimentavam continuando a editar disco atrás de disco de estúdio, e gravações com performances ao vivo magníficas que eu pensei que nunca veria pessoalmente. As suas canções acompanharam-me pela vida fora, reconheço-as aos primeiros acordes, sei cantá-las de fio a pavio, penso nelas e escrevo sobre elas porque preciso de aprofundar o sentimento e entender a paixão que nos liga.

Em 2007 resolveram tocar pela primeira vez para o público Português! Nitidamente ninguém os avisou do que era capaz este público. Erro crasso. Ficaram siderados com a recepção que tiveram e acho que se apaixonaram ali por nós.

Nem 2 anos depois estavam de volta. Outro concerto excepcional. Viagens a Itália, encontros em Lucca e em Pádua para consumar esta paixão e um amor cada vez maior, cada vez mais sentido, alimentado em conversas, em discussões e em partilhas com outros

5 anos de interregno e em 2015 a notícia de um novo concerto em Portugal. Desta vez já estariam preparados para este público e nós também para eles. Certo? Errado.
Duelo de vontades e declarações de amor recíprocas. A banda dá-nos aquela pérola de setlist única e inigualável talhada à medida para este público. Esta imensa minoria de devotos que vibra com cada nota, com cada performance, cada solo de cada músico. Se dúvidas havia da nossa parte ficaram esclarecidas. Todos os fãs ali presentes entenderam a dádiva que receberam. A DMB adora Portugal mas Portugal também adora a DMB. Aquela entrega, aquela paixão de parte a parte é indescritível. A banda teve naquela noite 8 elementos, os 7 em palco e 1 na plateia o público que se entregou com a mesma intensidade que a banda numa simbiose absolutamente perfeita.

Foi a noite de todas as emoções e todas as alegrias, mas para mim houve dois momentos muito especiais.

Boyd provocou-me a primeira grande emoção da noite em “Dancing Nancies” ao interpretar um dos seus solos de violino arrebatadores.  Olhos nos olhos com Dave Matthews, numa desgarrada musical soberba que leva à loucura a audiência já louca do Meo Arena. Ao vê-lo tocar assim, lembro-me que aquele homem é injustamente considerado por alguns como o mais  “fraco” dos músicos da DMB e isto diz muito sobre a qualidade dos outros músicos. Boyd é inacreditável e excepcional no seu solo, vejo-o triunfar e transcender-se. Sorri com o coração e eu sorrio com ele de felicidade. Uma lágrima traiçoeira cai-me mas poderia também ser do fumo que estava no Meo Arena (sim deve ter sido isso).

Na #41 tenho um momento meu com Dave Matthews. Perdão por esta fraqueza, mas este homem é o único músico no mundo que me desperta este tipo de sentimento: faço-lhe um coração com as mãos e tenho direito a 6 segundos de contacto visual directo (que uma fã de 2 décadas também tem direito ao seu momento Harry Styles com Dave Matthews). Ao contrário do que me aconteceu das outras vezes que estive com ele, não baixei os olhos com timidez mas mantive o olhar no dele, porque queria estar presente num raro momento de entendimento mudo partilhando por dois seres humanos que se veem um ao outro.

Espero que Dave tenha percebido com aquele gesto e com o meu olhar o que eu nunca lhe consegui dizer de viva voz: adoro esta banda. Entro na música dela puxada pelas letras dele e pela sua interpretação soberba das canções (que me provocam um deslumbramento intelectual) mas fico pelos inacreditáveis solos de Boyd – um dia aquele violino vai entrar em combustão espontânea, e eu espero estar lá para ver- pelas incríveis tareias que o maestro Carter dá à bateria, pelo magnífico duo Rashawn e Jeff Coffin nos metais, pelo baixo de Stefan Lessard e pelo virtuosismo de Tim Reynolds. Fico porque nunca sei onde eles me vão levar com as suas fantásticas jams. Sou sempre surpreendida, sempre arrebatada, sempre deslumbrada.  Fico porque a música da DMB contraria toda a minha razão porque é uma experiência corporal instintiva que desperta em mim algo de profundamente pessoal.
Dá-me uma sensação de companheirismo em relação a outras pessoas como se uma força me puxasse para uma parte de mim própria incompreensível e fantástica. É isto o que a Dave Matthews Band é para mim.

No dia seguinte a crítica musical portuguesa louva unanimente o concerto. Descobriram finalmente aquilo que alguns já sabem há décadas. O segredo foi finalmente revelado. Estão aqui nesta banda alguns dos melhores músicos do nosso tempo.
A Dave Matthews Band é a tal banda que não se deixa aprisionar em rótulos ou géneros musicais; que tem um som tão complexo e rico que é quase indefinível e que toca sempre com a alegria de uma banda folk, o virtuosismo de uma orquestra de música clássica, a paixão de uma banda rock, a entrega de uma banda soul e que improvisa como uma banda jazz. A minha Banda.

Já os vi 5 vezes e este foi o melhor concerto de todos. Foi o melhor concerto da minha vida. Nunca mais haverá um concerto épico como este. Tudo o que vier depois vai falhar em comparação.

Não se faz. É um abuso.

Muito, muito obrigada.

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